15 de dezembro de 2009

Informação por osmose

Dia desses ouvi de dois jovens, ambos com menos de 30 anos, que informação diária se obtém por osmose. "Por isso, não leio jornal", justificou um deles, tendo o outro como cúmplice da afirmação. Na hora, juro que o sangue subiu e deu uma vontade louca de vomitar milhões de palavras e palavrões, ou então gritar: "Porra, a gente se mata todos os dias pensando em formas de lides diferentes, novos assuntos, pautas ousadas e  você vem me falar que não é preciso ler nada disso para estar informado? Vai tomar no cú!". Não me arrisquei, não sou tão louca assim.

Voltei para casa com o sapo agarrado na garganta e muitas questões. Jornalista é um povo estranho mesmo. É uma gente louca, incoerente, desleixada, cheia de mania, acha que sabe de tudo, adora vender seu peixe e contar seus casos gloriosos.

Mas afinal, quem são eles? Que tribo de gente esquisita é essa, que a caminho da redação, em vez de ouvir no  carro o bom e velho rock'n roll para relaxar, escuta  a voz do colega de rádio dando as últimas notícias ? Que povo é esse que degusta o café da manhã saboreando manchetes, títulos, bigodes, lides e infografias?

Mas que gente louca é essa que é capaz de se mostrar firme ao entrevistar garotos do tráfico ou então meninas da prostituição, mas volta para a redação com os olhos cheios de lágrimas e chora como criança? Que gente maluca é essa que sai no meio do temporal, enquanto estão todos procurando um lugar para se esconder? Que povo incoerente  é esse que reclama do salário e dos chefes, mas quando sai da redação só sabe elogiar a profissão?

E pior: por causa de uma só matéria, esse desvairado  se mata todos os dias, corre contra o tempo, investiga dali, recebe tapa daqui, dá mais de 20 telefonemas em um único dia, ouve gritos de chefes, não tem tempo para almoçar e, muito menos, lanchar, fuma  um maço de cigarros em menos de 24 horas, não dorme, esquece de tomar água, acha que vai enfartar, tem pesadelos, manda emails para toda a sua lista para achar tal personagem, perde aula de pós graduação, cursinho disso e daquilo ...Para, num dia qualquer,  vê sua obra prima sendo usada para embrulhar bananas, peixes, pinturas ...ou ouvir de leitores em potencial que informação se obtém por osmose.

Com a palavra,  Gabriel García Márquez:
Porque o jornalismo é uma paixão insaciável que só se pode digerir e humanizar mediante a confrontação descarnada com a realidade. Quem não sofreu essa servidão que se alimenta dos imprevistos da vida, não pode imaginá-la. Quem não viveu a palpitação sobrenatural da notícia, o orgasmo do furo, a demolição moral do fracasso, não pode sequer conceber o que são. Ninguém que não tenha nascido para isso e esteja disposto a viver só para isso poderia persistir numa profissão tão incompreensível e voraz, cuja obra termina depois de cada notícia, como se fora para sempre, mas que não concede um instante de paz enquanto não torna a começar com mais ardor do que nunca no minuto seguinte

7 de dezembro de 2009

Despenteada


"Hoje aprendi que é preciso deixar que a vida te
despenteie,  por isso decidi aproveitar a vida com mais intensidade…
O mundo é louco, definitivamente louco…
O que é gostoso, engorda. O que é lindo, custa caro.
O sol que ilumina o teu rosto enruga.
E o que é realmente bom dessa vida, despenteia…
- Fazer amor, despenteia.
- Rir às gargalhadas, despenteia.
- Viajar, voar, correr, entrar no mar, despenteia.
- Tirar a roupa, despenteia.
- Beijar a pessoa amada, despenteia.
- Brincar, despenteia.
- Cantar até ficar sem ar, despenteia.
- Dançar até duvidar se foi boa idéia colocar aqueles saltos gigantes essa noite, deixa seu cabelo irreconhecível…
Então, como sempre, cada vez que nos vejamos
eu vou estar com o cabelo bagunçado…
mas pode ter certeza que estarei passando pelo momento mais feliz da minha vida.

É a lei da vida: sempre vai estar mais despenteada a mulher que decide ir no primeiro carrinho da montanha russa, que aquela que decide não subir
Pode ser que me sinta tentada a ser uma mulher impecável,
toda arrumada por dentro e por fora,
O aviso de páginas amarelas deste mundo exige boa presença:
Arrume o cabelo, coloque, tire, compre, corra, emagreça,
coma coisas saudáveis, caminhe direito, fique seria…
e talvez deveria seguir as instruções, mas
quando vão me dar a ordem de ser feliz?
Por acaso não se dão conta que para ficar bonita
eu tenho que me sentir bonita…
A pessoa mais bonita que posso ser!
O único que realmente importa é que ao me olhar no espelho,
veja a mulher que devo ser.
Por isso, minha recomendação a todas as mulheres:
Entregue-se, Coma coisas gostosas, Beije, Abrace,
dance, apaixone-se, relaxe, Viaje, pule,
durma tarde, acorde cedo, Corra,
Voe, Cante, arrume-se para ficar linda, arrume-se para ficar confortável,
Admire a paisagem, aproveite,
e acima de tudo, deixa a vida te despentear

O pior que pode acontecer é que, rindo frente ao espelho, você precise se pentear de novo...!!"

Autor (a) desconhecido

3 de novembro de 2009

QUE PAÍS É ESSE?




Taí a juventude brasileira. Não. Eles não foram às ruas para retirar Sarney do poder. Tão pouco tiraram a bunda da cadeira diante do escândalo do mensalão. E muito menos levantaram a voz em busca de empregos decentes. Eles fizeram muito mais do que isso. Foram capazes de se unir para um ato de quase linchamento e estupro coletivo de uma garota de minissaia

Pobre Leila Diniz..... Deve estar agora se revirando no túmulo! Ela que quebrou tabus de uma época em que a repressão dominava o Brasil,  neste momento deve estar com vergonha da geração que quase viu nascer.

Burcas já! Pois hoje, uma simples minissaia choca mais que corrupção e impunidade.

O que esperar desses jovens (universitários)  ? E das mulheres, (mas que vergonha da classe), que chamaram a pobre garota de PUTA? E se fosse, qual é o problema? Hipocrisia é pouco. O manifesto desumano desses jovens brasileiros demonstram o quanto ainda está atrasada uma sociedade. Pensando bem, o retrocesso está numa geração que chegou quando a luta pela liberdade de expressão já tinha entrado para a história.

Talvez seja isso. A juventude de hoje ( e eu sou dessa juventude)  nasceu com a faca e o queijo nas mãos. Chegou  com "quase" tudo mastigado. Acomodaram. Restaram a eles refletir sobre quem é a protagonista de Malhação ou o próximo líder do Big Brother Brasil. Talvez seja essa falta de perspectiva e  de luta que foram capazes de mobilizar rapazes e garotas em prol de um moralismo barato, daqueles que as telenovelas ensinam tão bem! 

Que volte a ditadura! Mulheres, coloquem suas burcas! Homossexuais, voltem para os armários ! Vamos nos reprimir, antes que chegue o carnaval e  toda nudez seja permitida.

Respondendo ao poeta: Esse é o Brasil.

3 de outubro de 2009

20 de setembro de 2009

Poliglota!



Rádinho à pilha  no ouvido. Torcida tensa. Timão em campo. Domingo e dia de jogo em Governador Valadares, no Vale do Rio Doce, interior de Minas. O sol escaldante exigia uma boa gelada para ajudar torcedores a engolir as fraucatuas do juíz .  E não é pra menos. Antes mesmo dos 5 minutos do primeiro tempo, o homem já havia atirado dois cartões amarelos e muitos apostavam que o vermelho não ia custar a sair.

O que era tensão virou desespero. As duas torcidas (não cabe aqui dizer quais eram os times) já estavam indignadas com a postura daquele  homem todo de preto,  que achava que  ter um apito em mãos  era  o mesmo que ter o rei Pelé na barriga.   A coisa esquentou quando o juíz marcou um pênalti que nem mesmo a torcida que seria beneficiada acreditou no que via. No auge da baderna, os palavrões dos fanáticos prejudicados ganharam o estádio.

Era xingamento para tudo quanto é lado. "Vai roubar da mãe", dizia um. "Viado que gosta de.....", gritava outro. "Fedaputa sem vergonha, chupador...", esbravejava algum sem noção. Bom, as frases  eram disso para pior. Mas ninguém contava com a astúcia de "Seu Joaquim" - homem pacato, honesto, com três filhos marmanjos e uma moça prestes a se casar. Com a sua bermuda surrada e o chinelo de dedo tradicional do domingo, Seu Joaquim, que não perde a paciência por nada nesse mundo, não aguentou  ver o timão levar de goleada por roubo de juíz. Aliás, ninguém aguenta.

Mas com Seu Joaquim foi diferente. A paciência perdeu o limite. E vendo os companheiros soltando a franga (na melhor das intenções) ele respitou fundo, pois a essa altura o sangue já estava quente.  Encheu o peito, levantou da arquibancada (ainda cambaleando de raiva), olhou para o juíz e com todo o ódio que lhe cabia  lascou o palavreado: "Seu poliglota!!!!!!!!". Ninguém mais disse uma palavra sequer.

19 de junho de 2009

Palavra de cozinheira

Dentro de mim, tem uma cozinheira de garfo e faca nas mãos. De avental sujo, com cheiro de cebola e pimentão. Uma mulher que experimenta, gosta de temperos, sente sabores, prefere o verde das folhas e preza paladares. Daquelas que têm cuidado com o corte da carne, que sabe que o manjericão nem sempre traz o melhor aroma. Que olha para o relógio e corre contra o tempo para que a mesa esteja pronta no horário certo. Mas muitas vezes não está. A correria é diária, nada pode sair errado. Copos à mesa, talheres limpos e tolhas brancas. Saúde!

Sim, senhor Gilmar Mendes, dentro de mim vive uma cozinheira. Uma mulher que conhece bem os modos de preparo e os ingredientes de uma boa macarronada de domingo. Que já experimentou comidas de todos os tipos e gosto e, até hoje, diante de um belo prato, tenta arriscar em receitas e aprender com elas. Ser cozinheiro, meu caro presidente do Supremo Tribunal Federal, não é para qualquer um. Tem que ter paixão pelo trato dos alimentos, tem que saber a medida certa do sal e do açúcar. Conhecer as pitadas e se arriscar em experimentar. Tem que estar atento às novas modas da cozinha para não deixar nenhum paladar desapontado.


Ilustríssimo Gilmar, ser uma mulher da cozinha requer paciência. Não se torna cozinheira da noite para o dia. E nem adianta dizer que aqueles que sabem fazer o arroz com feijão são cozinheiros. Não. É como se considerássemos que o curandeiro é médico. Ou melhor, que o detento que conhece muito da lei fosse juiz. Não. Para ir para a cozinha leva-se tempo, mesmo porque tem sempre um engraçadinho que sabe fritar ovos e acha que isso já basta.


Dentro de mim, essa mulher teme pelo futuro dos restaurantes já que agora qualquer um pode ser cozinheiro. O que será dos paladares exigentes? Das narinas que não aceitam qualquer aroma ? Daqueles que apreciam cardápios como se devorassem uma notícia de jornal? A qualidade é que faz a diferença e abre o apetite.

"Um excelente chefe de cozinha poderá ser formado numa faculdade de culinária, o que não legitima estarmos a exigir que toda e qualquer refeição seja feita por profissional registrado mediante diploma de curso superior nessa área", disse o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, ao defender a não obrigatoriedade do diploma de jornalismo.

14 de junho de 2009

Desafio de todo o dia

Ok. Eu confesso: sou uma jornalista manteiga derretida. Já chorei em encontros de desaparecidos, já abri o berreiro acompanhando uma cirurgia de um recém nascido , já voltei para a redação com os olhos cheio d'àgua depois de entrevistar Dona Maria e reconhecer que o meu mundo é fácil demais. Lágrimas já desceram quando vi mães chorando a morte de filhos. Já engoli seco ao ouvir o desespero de um pai para salvar o seu bebê dentro de um hospital. Fiquei sem dormir quando vi os corpos de dois homens assassinados com 19 perfurações. Mas, na última semana, descobri que essa manteiga derretida está ficando mais pastosa.


Não sei se a gente vê e ouve tanta coisa que a emoção acaba se desgastando. Em miúdos, ficamos mais frios. Tive que cobrir o desabamento de uma lage numa construção, onde 9 pedreiros ficaram soterrados e, destes, um morreu. Se fosse há um tempo, lógico que, no mínimo, sentiria um frio na barriga ou algum arrepio. Mas não. Desta vez nada aconteceu. Nadinha mesmo. Quando cheguei ao local, meus colegas já estavam fazendo o seu trabalho: entrevistando, apurando etc e tal. Fiz o mesmo. Mas todo o tempo, estava preocupada se o fotógrafo tinha fotografado algum dos feridos sendo resgatados.

Um colega da TV ainda me disse: "Tomara que tenha algum outro para ser resgatado para dar uma imagem boa". No fundo, no fundo, eu também esperava por isso. As nossas perguntas aos militares do Corpo de Bombeiros giravam em números. "São 13 pessoas?", perguntava um. "Tem mais algum morto?", perguntava outro. E essa expectativa me atormentou durante um bom tempo.

Lembro que quando estava na faculdade, a jornalista Leila Ferreira fez uma palestra e disse que "nunca um repórter poderia ficar frio diante dos fatos". Concordo em número, gênero e grau. Mas como não se acostumar ? Fica aí o desafio.